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Desempenho Humano e Organizacional (HOP)

Desempenho Humano e Organizacional (HOP) por Adilson Monteiro

O gerenciamento de segurança tradicional ou "normal" tende a concentrar seus esforços em três pontos:

  • Segurança é definida como a ausência de desvios ao planejado (por exemplo, acidentes, riscos inaceitáveis, atos inseguros etc.)
  • As pessoas são um problema que deve ser controlado;
  • A organização se concentra na Segurança como uma responsabilidade hierárquica e de forma burocrática;

Assim o sistema de gestão da Segurança, na maioria das organizações, a meu ver, é implantada com procedimentos, disciplina e ação da hierarquia. Como Segurança devemos cobrar que o procedimento seja realizado tal qual o escrito, cobrar disciplina e acionar a hierarquia para corrigir desvios (comportamentais e de processo).

Mas um dia, acontece um acidente sério, e inicia-se uma investigação para apurar os “desvios” para sua correção e chega a uma difícil pergunta feita pela organização:

“Por que um funcionário(a) treinado, habilitado, com conhecimento dos procedimentos (técnicos e de segurança) tomou esta atitude irracional para se acidentar?”

Pessoalmente, já me deparei com esta situação muitas vezes. E a resposta padrão aceita é: foi um erro humano.

Assim, por ser um erro humano temos que dar exemplos e corrigir comportamentos inseguros. Certo?

Em busca de entender e promover o comportamento seguro, apresenta-se teoria da Segurança Baseada em Comportamento (BBS) surgiu há mais de 20 anos nos Estados Unidos e na Europa Ocidental o conceito e depois programa.

O BBS consiste em um processo sistemático de observação no qual os trabalhadores são treinados para observar os outros enquanto trabalham. Os observadores abordam seus colegas de trabalho e, munidos de uma checklist contendo comportamentos e práticas seguras, conversam sobre como eles vêm executando as tarefas.

 Exemplifico o conceito e sistema na figura abaixo:

Porém esta maneira também não respondeu a pergunta acima. Implantado o sistema em algumas empresas por que passei , ainda tinha que tentar responder a mesma questão.

Algumas dificuldades com o programa BBS:

·       Forte oposição do sindicato, com entendimento que o BBS é uma maneira institucionalizada de culpar e punir os trabalhadores (as) que sofreram acidentes; (veja matéria “Blame the Worker” nas referências)

·       O foco é o trabalhador e não o processo, já que muitas situações devem ser administradas somente com a atitude dos trabalhadores(as), devido aos impactos e custos na mudança do processo;

·       A questão de se ter os observadores formados no programa como “vigias” dos outros colegas de trabalho não é bem vista, especialmente em culturas latinas como a do Brasil, e muitas vezes, tende estes observadores a não reportar desvios e potenciais de acidentes para manter ao bom relacionamento nas equipes de trabalho;

·       A premiação dos trabalhadores(as) reconhecendo o comportamento seguro pelo programa BBS criam uma atmosfera de medo e intimidação no local de trabalho. Se trabalhadores ou grupos de trabalhadores estão competindo por prêmios de segurança, geralmente sofrem pressão dos colegas para não denunciar uma lesão ou desvio, para não perderem o prêmio coletivo , degradando assim a Segurança; 

Particularmente eu já vivi todas estas situações e realmente não tenho o BBS como um programa que possa fornecer resultados que se sustentam ao longo do tempo.

 Assim, comecei a tratar a questão da Segurança é um tema complexo que precisa ser analisado de forma sistêmicas e não somente com foco em pessoas, ou seja , mas também no  processo e na  empresa (visão e políticas), de maneira integrada.

Fiquei muito feliz quando tomei contato com a teoria do Desempenho Humano e Organizacional (HOP). Fiquei mais confortável e acolhido pois não estou sozinho pensando em uma nova abordagem da Segurança.

O gerenciamento da Segurança “tradicional” tende a se concentrar em "consertar" o trabalhador(a) após cometer um erro ou sofrer um acidente. Por outro lado, o HOP se concentra em consertar o sistema no qual o erro ou acidente ocorreu.

O Dr. Todd Conklin, é um expoente desta forma de enxergar a Segurança de uma forma mais holística , ao qual estou plenamente alinhado com  sua proposição. Ele afirma:

“Em resumo, o HOP é uma filosofia operacional industrial que reconhece a segurança (e a qualidade) como uma propriedade emergente do sistema como um todo. Bom desempenho da Segurança não é a ausência de erros (o erro humano é inevitável), é a presença de defesas”

Outras afirmações importantes do Dr. Conklin:

Mude o seu pensamento de "Quem falhou" para "O que falhou"

Devemos parar de ver os trabalhadores como problemas a serem corrigidos. Mas, como soluções a serem aproveitadas

“Você pode culpar e punir ou aprender e melhorar. Você não pode fazer as duas coisas.” Todd Conklin

“Segurança não é a ausência de acidentes. Segurança é a presença de Capacidade.” Todd Conklin

Os princípios HOP (Human and Organizational Performance)  permitem a humanização do processo e relação com a hierarquia com seus cinco princípios:

- Errar é humano: como característica intrínseca das pessoas no processo e portanto ela entra como variável a ser considerada do design do que algo que deva ser combatido;

- Culpar não resolve nada: a culpa na organização está diretamente relacionada a valorização do pensamento de comando e controle na liderança e o o entendimento de que os erros são acima de tudo uma oportunidade de aprendizado e participação das pessoas , muito ligado ao conceito de Segurança Psicológica a ser desenvolvido na Organização;

- Aprender é vital:  significa em desenvolver como Organização  as condições e recursos de aprendizado desde a apresentação da tarefa aos trabalhadores(as), resiliência e como criar times autônomos multidisciplinar para solução de problemas dinâmicos no processo;

- O contexto dirige o comportamento: entender a dimensão do contexto é fundamental , pois ele não se refere às condições físicas do processo mas também as intangíveis , ou seja , a relação do humano com o trabalho está compostas pelos meios de produção e as condições sociais representadas pela hierarquia e trabalho em grupo, particularizadas para cada organização;

- A resposta do líder importa: a capacidade da liderança em influenciar o ambiente para a prevenção especialmente integrando a Segurança como parceiro na criação do próprio Negócio.

O HOP, a meu ver, faz todo o sentido, porque é uma visão do que acontece na prática em nossos processos organizacionais.

Em todas as empresas que participei, em várias oportunidades de implantação de novos projetos, de uma forma sistemática ou não, eram adaptados para a realidade depois do envolvimento direto dos operadores, pois somente a visão dos engenheiros não cria a situação real de funcionamento seguro sem a interação com quem usa o sistema projetado.

Esta condição se tona mais forte quando o grupo ou célula de operação atua e acorda os procedimentos base para a operação do sistema, criando uma cognição social do que deve ser feito e facilmente replicado, e ainda, se desenvolve ao longo do tempo de uso do sistema.

A adaptação constante das equipes para atingir os objetivos da empresa aliada à necessidade da Segurança do grupo, se fazem de uma forma dinâmica e por vezes diferente do planejado e estruturado teoricamente nos procedimentos e regras gerais.

O Dr. Jeans Rasmussen em seu artigo “Risk management in a dynamic society A modelling problem” (1997) nos dá também esta condição do processo real e o imaginado quando foi desenhado, ele afirma neste artigo:

· “Existe uma migração sistêmica do comportamento organizacional em direção a acidentes sob a influência da pressão em relação ao custo-benefício em um ambiente agressivo e competitivo”.

· “Considerando o problema do desvio frequente das instruções e regras normativas de trabalho, não é de admirar que seja frequentemente concluído nas análises de acidentes que o 'erro humano' é um fator determinante em 70-80% dos casos. Além disso, vários erros e falhas contribuintes são normalmente encontrados, porque várias defesas contra acidentes são geralmente planejadas para processos perigosos”.

Portanto o processo real de execução de uma trabalho (exemplo tarefa em uma linha de produção) , devidamente planejada e procedimentado, na realidade existe um outro ritmo de execução para atender os diversos desafios e pressões para atingimento dos objetivos organizacionais, ao mesmo tempo com a intenção e propósito de se manter a Segurança da equipe. Porém esta diferença entre o real e o teórico , criam lacunas ( “gaps”) durante a execução do processo tais como :

  • Ações Preventivas Essenciais e o limite do risco que pode ser assumido, e assim passando esta fronteira, o risco já não pode ser administrado e consequentemente o acidente acontece.
  • Execução do trabalho e as oportunidades de melhoria, para chegar próximo da linha de planejamento ideal da execução. A sua distância do planejado pode criar uma condição de degradação econômica ou uma produtividade inaceitável para atendimento dos compromissos corporativos.

Logo , o que aplico atualmente , é entender no processo o que falhou para que o funcionário teve um comportamento de desvio acima do risco tolerável para se acidentar , e como o sistema pode ser corrigido pra que tal necessidade de desvio não aconteça para atender os objetivos da empresa, conforme filosofia do HOP.

Trocar o pensamento de “quem” desviou para “o quê” provocou o desvio, é essencial e o que me motiva para a promoção de uma Segurança estável e permanente na organização. Aliado esta concepção com o tratamento das questões da Segurança em grupo permitindo o diálogo e ajuste no processo permitem um clima de aprendizado e não de terror, podendo estabelecer a consciência coletiva da prevenção e proteção ao humano na organização.

Recomendo assistir os dois vídeos abaixo com a participação do Dr. Conklin, onde brilhantemente, ele conduz a compreensão deste nova abordagem da Segurança e a importância de assumir a visão  HOP nos nossos processos de gestão da Segurança , para que realmente atinjamos um estágio de prevenção de acidentes , especialmente os sérios e fatais.

Convido também conferir os 5 Princípios do HO, explicados pelo próprio Dr. Conklin abaixo:

Vídeo 1 : Plenary session during ASSE Safety 2017

https://www.youtube.com/watch?time_continue=30&v=43u61TQpOxQ&feature=emb_logo

Video 2 : 2018 USW HSE Conference: The New View of Safety with Todd Conklin

https://www.youtube.com/watch?v=IoYUQlWiRgc

Slides presentation:

http://www.esafetyline.com/eei/conference%20pdf%20files/2017spring/general/Todd_Conklin.pdf

Referências :

·        Rasmussen, Jens. (1997). Risk management in a dynamic society: A modelling problem;

·        Tood Conklin (2012). Pre-Accident Investigations: An Introduction to Organizational Safety- CRC Press.

·        Tood Conklin (2019). The 5 Principles of Human Performance. Publicação Independente.

·        Coletânea de autores (2022): Nova Visão de Segurança no trabalho; um olhar brasileiro – Editora Nelpa 

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